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Polo de inovação deverá resgatar a trajetória científica de Sousa

publicado: 27/06/2019 09h05, última modificação: 27/06/2019 09h37
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O anúncio da construção de um polo de inovação no Município de Sousa, no Sertão, uma iniciativa do Governo da Paraíba, criou expectativas positivas na cidade entre representantes do setor produtivo, da sociedade civil organizada, da classe política, mas causou um impacto diferente entre os professores e pesquisadores do Instituto Federal da Paraíba - Campus Sousa: trouxe esperança. No IFPB opera o Hospital Veterinário, referência para animais grandes, de produção, e pequenos, de companhia. No ano passado, mais de 600 cães e gatos foram atendidos. No mesmo período, neste ano, os atendimentos aumentaram 25%. Há também a Escola Fazenda, onde são mantidas as Unidades Educativas de Produção, com diversos produtos agropecuários. Junto com os demais cursos nas áreas de Humanas e Exatas, a universidade é fonte de conhecimento não apenas vindo de fora, mas de descobertas das características do próprio território.

No período jurássico - falamos em mais ou menos 63 milhões de anos atrás - na região onde atualmente está o município de Sousa, habitavam dinossauros. Eles deixaram suas pegadas petrificadas que impressionam visitantes de vários locais de dentro e de fora do Brasil. Há cerca de dez ou seis mil anos, segundo a Associação Paraibana de Arqueologia, grupos nômades transitavam por rotas que passavam por ali e se demoravam em determinados locais onde imprimiram pinturas rupestres nas rochas, visíveis hoje, assim como as pegadas dos dinos.

Incorporado às pegadas e às pinturas, está uma população beirando os 70 mil habitantes (IBGE 2017), a sexta cidade mais populosa da Paraíba, a maioria jovens, entre 15 e 30 anos, que moram na zona urbana. Pouco mais de um quinto das pessoas vivem na zona rural. Há quatro assentamentos na área do município, onde trabalham 309 famílias, além de nove assentamentos nos municípios circunvizinhos (Incra-PB). Outro fator que se destaca no retrato de Sousa é a presença dos ranchos de ciganos, acomodados em casas de alvenaria construídas nos bairros ao longo da entrada da cidade, na BR 230, no sentido de quem vem de João Pessoa.

Os cursos de Ensino Médio Técnicos na Escola Estadual Cidadã Integral Chiquinho Cartaxo, ou no Instituto Federal da Paraíba, são frequentados não só por sousenses como também pelos moradores das cidades próximas. Duas universidades oferecem vários cursos de graduação e pós-graduação, a Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e o IFPB.

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O histórico de Sousa com a pesquisa científica não é recente. Na década de 1930, o Engenheiro Agrônomo José Augusto Trindade começa a estudar profundamente as características do Semiárido. E consolida em São Gonçalo, Sousa, o Instituto José Augusto Trindade em 1940, inaugurado por Getúlio Vargas, o primeiro centro de pesquisa da área seca do mundo. Agora, uma unidade do IFPB.
Anterior a isso, as pegadas de animais desconhecidos atraíram cientistas do exterior. Conta a história oral que no final do século XIX, Anísio Fausto da Silva, morador da região, descobriu o que chamou de “rastro do boi e da ema”; o boato se espalhou e, nas décadas seguintes, pesquisadores estrangeiros vieram a Sousa até que, de fato, atestaram cientificamente ser pegadas de dinossauros.

Esse histórico local relacionado à pesquisa unido à capacidade de inovação que os estudantes de Sousa demonstram ter hoje, e às forças produtivas, fazem do projeto de construção do polo de inovação uma necessidade urgente.

Na última semana, a Secretaria de Estado da Educação e da Ciência e Tecnologia (SEECT) convidou representantes dos mais variados setores para apresentar o projeto do polo de inovação. O prefeito Fábio Tairone e o vice-prefeito, Zenildo Oliveira, endossaram o projeto, além do Gerente do Sebrae em Sousa, Antônio Felinto, o representante da sociedade civil organizada, advogado, César Nóbrega, o deputado estadual Buba Germano, presidente da Frente Parlamentar de Ciência, Tecnologia e Inovação, e o diretor do IFPB - Campus Sousa, Francisco Cicupira, quem demonstrou grande interesse.

O Secretário-executivo de Estado da Ciência e Tecnologia da Paraíba, Cláudio Furtado, afirma que o polo de inovação terá a multidisciplinaridade como característica: “A tecnologia permeia todas as atividades e é transversal, além do que, o polo irá potencializar as pesquisas científicas que são feitas nessa região”.

Para professor, polo de inovação irá democratizar o conhecimento

Ao falar sobre o que espera do polo de inovação, Francisco Roserlândio Nogueira, chefe do Departamento de Produção, de Pesquisa e Extensão Campus Sousa do IFPB, sugere que “o polo deverá um espaço onde se vai gerir processos que nos permitirão, cada vez mais, democratizar o acesso ao conhecimento, à informação, à ciência, à tecnologia. Fatores que, historicamente, estiveram, na maioria das vezes, à serviço da construção de um modelo concentrador de capital, de recursos. Quem tem o domínio do conhecimento, da tecnologia, acumulou capital, acumulou recursos, acumulou poder”.

Professor na graduação, nos cursos técnicos, Nogueira destaca a movimentação do governo estadual, com iniciativas de vir até os territórios e chamar para si a responsabilidade de políticas públicas para uma população que vê a cada dia a perca de conquistas importantes. “Nos sentimos felizes em ter a esperança de que essas políticas públicas permanecerão porque o Governo Estadual está nos territórios. Vamos garantir que algumas dessas políticas permaneçam”.

Nogueira aponta a dificuldade financeira pela qual a atividade de pesquisa passa, como um problema conjuntural, mas o que realmente lhe preocupa é a missão de mobilizar, sistematizar, produzir conhecimento que possa atender a problemática do território onde está inserido. “Uma das estratégias é a formação das pessoas. Mas o estudante atual quer inovação, quer tecnologia, novos processos. Se não conseguirmos inovar nas unidades educativas, não vamos atrair os estudantes. Inovação aplicável, que dialogue com o mundo real dos estudantes”.

O professor complementa explicando que o polo permitirá sistematizar experiências vividas pelos agricultores, pescadores, que podem ser irradiadas para outras pessoas, para que as soluções estejam à disposição da população do semiárido, “do povo do Sertão, que carece de ter reconhecida a sua capacidade de produzir conhecimento, de inovar a partir da relação que esse povo tem com o lugar onde vive.”

Hospital Veterinário gera ciência

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O Hospital Veterinário do IFPB Campus Sousa começou a funcionar em 2014 realizando cirurgias, diagnósticos por imagem, pesquisas, entre outros. Em 2019, com a abertura do Programa de Especialização Veterinária, mais nove médicos ingressaram, o que permitiu um aumento de 25% nos atendimentos. A professora Lisanka Angelo Maia informa que a próxima meta é a formação da Residência Médica Veterinária, o que ampliará a unidade.

“O Hospital tem gerado ciência todos os dias, através dos atendimentos e acompanhamentos; um serviço que atende cidades até do Ceará e do Rio Grande do Norte”, comenta Lisanka Maia, ressaltando que o polo de inovação será um ponto de divulgação do que é gerado no IF em Sousa.

“O polo dará suporte para projetos de interesse da população de Sousa e de outras comunidades do estado. Recentemente iniciamos uma pesquisa em torno de um parasita encontrado em diversos animais daqui; temos resultados preliminares e estamos preparando um parecer para ser compartilhado com outras instituições veterinários e da área da saúde. Neste ponto é importante estarmos inseridos em um ambiente que reúna conhecimentos diversificados, como o polo de inovação”, salientou a professora Lisanka.

Ensino e inovação: o que os estudantes esperam

A reportagem pediu indicação ao professor Francisco Roserlândio Nogueira e entrou em contato com os estudantes por aplicativo de mensagens via Internet, para saber o que eles esperam sobre “ ensino e inovação”. Nogueira revelou: “A maior parte dos nossos estudantes vêm das famílias de agricultores da região. Temos turmas que chegam a 70% têm endereço rural. Quando eu comentei com os professores colegas sobre quem indicar, choveram nomes. Em outros tempos, talvez não tivéssemos tantas possibilidades de quem pudesse fazer essas falas em nome dos estudantes!”

Jorge Luis Garcia Mendes. Técnico Integrado em Meio Ambiente

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“O ensino não fica restrito apenas à sala de aula, vai além; o aluno tem a oportunidade de trabalhar dentro de projetos de pesquisa e extensão, o que o leva a conhecer áreas afins. Sou bolsista extensionista desde o 1° ano, o que me possibilita ter novas visões sobre a atuação como técnico e me prepara para o campo de trabalho, amadurecendo novas visões para escolha do curso em nível superior. Torço e aspiro que as universidades inovem cada vez mais. No atual panorama, me preocupa ter que garimpar oportunidades no campo de trabalho, pois as chances de atuação na região ainda são restritas.”



José Edirailson Quirino Júnior. Licenciatura em Química

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“Sinto-me preparado para trabalhar de forma inovadora no mercado de trabalho, uma vez que já trabalho através do programa Residência Pedagógica, o qual me proporciona ministrar aulas em um dos cursos Técnicos, aqui no IFPB Campus Sousa. Nessa turma utilizo diversos recursos inovadores através das TICs: como o uso de softwares educacionais, jogos didáticos, atividades experimentais, etc. Esses conhecimentos não foram adquiridos da noite para o dia. Ocorreram por causa da minha presença constante no campus, participando ativamente de congressos, palestras, mini-cursos, etc. Tudo isso graças a ajuda do IF e da minha família. Todas as disciplinas que cursei me ajudaram de forma significativa para minha formação tanto como profissional quanto como pessoa.”

Myrella Dantas de Almeida. Letras com habilitação em Língua Portuguesa – Modalidade à Distância

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“Como eu pretendo inovar no mercado de trabalho? Será dentro da sala de aula, inseririndo práticas diferentes. A universidade está me dando esse suporte. A discussão atual é como nós podemos utilizar a tecnologia, seja qual for. Como podemos inserir nosso aluno nas discussões em sala. As mídias estão mais acessíveis para classes econômicas mais baixas. De que adianta eu ter uma bagagem renovada e perpetuar o ensino tradicional? Não existe um método, nem uma fórmula, para que essas soluções inovadoras aconteçam. É preciso estar preparada e ter a iniciativa, o desejo de transformar.”

Moacir David de Almeida Gonçalves. Curso Técnico em Meio Ambiente

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“Observamos que a tendência do ensino é que o aluno participe do processo da construção do saber. Os professores estão entendendo que o potencial do aluno é maior quando ele participa do ensino, fazendo aulas práticas. Espero que conciliemos cada vez mais a teoria e a prática. [Para inovar,] eu posso enxergar além do que pode ser visto em qualquer esfera de trabalho e acoplar o conhecimento técnico e científico. Na universidade eu espero que se inove na transmissão do conhecimento, com aulas mais dinâmicas e que possamos estar ligados com a formação profissional e a produção técnico-científica."


Ana Caroline Fernandes de Sousa. Curso Técnico em Informática

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"Eu espero uma didática nova e apropriada para a geração atual. Pois, os docentes mantém uma didática ultrapassada. Precisamos ter aparelhos tecnológicos, cursos para que professores aprendam a utilizar os programas e até o próprio sistema acadêmico. Os discentes chegam muito tecnológicos, a cada dia progridem mais, desenvolvem sistemas, apropriam alguns já feitos. Esperamos incluir a tecnologia no mercado de trabalho. A área da informática engloba todas as outras e com ela podemos incluir e inovar. O mercado procura profissionais que estejam em desenvolvimento sempre com o que é lançado."



Naiara Menezes Bezerra. Superior em Tecnologia de Alimentos

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“Desde o Ensino Médio Técnico e agora na graduação, não ficamos só na sala de aula, nem só na palavra do professor. Eles nos instigam a procurar coisas novas, a partir de artigos científicos, para produzir o nosso artigo. Apesar das dificuldades que enfrentamos, os professores conseguem trazer coisas novas. Vemos na prática o que vimos na teoria. Nos laboratórios, pesquisas, vivências, visitas técnicas, congressos, artigos publicados. O ensino que tivemos vai levar a inovação para onde eu moro, por consequência. Uma nova ideia para uma comunidade que precise e não enxergue.”

 

 

Ascom SEECT/Fapesq