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Pesquisa Paraíba
Pesquisadores usam software para catalogar o passado escravista da Paraíba
Pesquisadores da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) e Universidade Federal da Paraíba( UFPB) estão desenvolvendo um software inovador, com 739 documentos sobre escravização e pessoas escravizadas na Paraíba. O projeto tem como objetivo principal fazer com que professores e alunos do ensino médio percebam a utilidade do programa de computador no ensino da história da escravização.
A pesquisa é coordenada pela professora doutora Francinete Fernandes de Sousa, do Curso de Arquivologia da UEPB e assessora pedagógica da Associação de Apoio a Comunidades Afrodescendentes da Paraíba (AACADE), e contou com a participação de Roberta Marques Sarmento, aluna bolsista da UEPB, e Henrique Brandão, aluno voluntário do curso de Computação da UFPB. O projeto está sendo financiado pelo Governo da Paraíba, através de edital da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior (Secties) e da Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba (Fapesq), por meio de bolsas de iniciação científica para alunos egressos da rede pública, no valor de R$ 700 mensais, por 24 meses. O Governo investiu no edital R$ 3,3 milhões em 200 bolsas de iniciação científica.
O estudo tem como objetivos realizar a classificação precisa e organizada de documentos relacionados aos escravizados na Paraíba; inserir os dados dos documentos no software de gerenciamento de informações de forma consistente e detalhada; analisar os dados catalogados para identificar padrões, tendências e informações relevantes sobre a população escravizada na região; e desenvolver habilidades de pesquisa, classificação, análise de dados e comunicação acadêmica ao longo do projeto.
Segundo a professora Francinete, o projeto é desdobramento de uma pesquisa de 12 anos realizada em fundos arquivísticos de diversas instituições que guardam documentação histórica na Paraíba e se caracteriza como uma continuação de três projetos anteriores do PIBIC - Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica. "Enfrentamos desafios como a inserção e classificação do documentos, porque em muitas instituições públicas ainda há a carência do profissional arquivista que é a pessoa indicada para organização e preservação documental, bem como a realização de testes de usabilidade", enfatizou. Essa nova fase da pesquisa, que teve início em 2024, será realizada até 2026, permitindo uma análise documentária e diplomática detalhada e abrangente sobre documentação de escravizados na Paraíba, permitindo reflexões sobre ensino, pesquisa e extensão.
A pesquisa não apenas busca a organização e armazenamento de dados, também tem um grande impacto social, ao desenvolver no aluno do ensino médio das escolas públicas o gosto pela pesquisa e pela busca de fontes primárias, como os documentos históricos.
Francinete afirma que os benefícios da pesquisa incluem a promoção de uma educação mais inclusiva e representativa, a valorização da história local e a conscientização sobre a escravização . "O software oferece aos educadores e alunos ferramentas para uma melhor compreensão das narrativas históricas da escravização na Paraíba, contribuindo para o reconhecimento e a justiça social", salientou a pesquisadora.
A pesquisa está utilizando métodos eficientes para captar a aceitação e a usabilidade do software. Os resultados esperados incluem uma maior apreciação do ensino da história da escravização e a identificação de desafios na implementação do software nas escolas.
Roberta Marques Sarmento, a bolsista do projeto, destacou a importância do investimento da Fapesq, afirmando: "A bolsa permite que eu tenha 20 horas semanais remuneradas, o que é fundamental para o deslocamento na coleta, digitalização e análise dos documentos, além de viabilizar a realização de entrevistas e questionários com a comunidade escolar." É um passo significativo na transformação da percepção histórica e no reconhecimento da memória coletiva, trazendo à luz as histórias que, por muito tempo, permaneceram nas sombras.
Entre vários documentos históricos encontrados, destacam-se os livros de batismo, que oferecem uma visão dolorosa da realidade dos escravizados no Brasil. Nesses registros, é comum encontrar apenas o primeiro nome dos escravizados, seguido pela palavra "escravo" como sobrenome, o que demonstra o apagamento de sua identidade e a total desumanização daqueles que tiveram sua condição marcada tanto na pele quanto nos documentos oficiais. Essa prática brutal reflete a falta de respeito pelos direitos humanos e a perda de identidade imposta aos escravizados.
A professora Francinete destaca a importância de reconhecer essa parte sombria da história brasileira, afirmando que a Paraíba, assim como outras regiões, precisa conhecer e reconhecer seu papel nesse "holocausto brasileiro". Esse reconhecimento é essencial para entender a complexidade da história e promover uma reflexão mais profunda sobre as consequências duradouras da escravidão na sociedade brasileira, enfatizou.