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Pesquisadores clonam os primeiros embriões do veado-catingueiro

publicado: 26/10/2020 11h26, última modificação: 26/10/2020 11h26

Pesquisadores da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e da Universidade Estadual Paulista (UNESP) conseguiram clonar os primeiros embriões de cervídeo neotropical, utilizando a técnica de Transferência Nuclear de Células Somáticas interespecífica (TNCSi). O experimento, que gerou clones do veado-catingueiro (Mazama gouazoubira), foi pioneiro no mundo no tocante à clonagem de cervídeos neotropicais. Os trabalhos sobre a reprodução de cópias geneticamente idênticas de um mesmo cervídeo são raros. Segundo o professor Vicente José Freitas, da Faculdade de Veterinária da UECE, um dos coordenadores do projeto e pesquisador 1D do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), não havia publicações sobre clonagem interespecífica em cervídeos tropicais até então. A experiência foi publicada em artigo no periódico Cellular Reprogramming. A equipe foi liderada pelos professores Vicente e José Maurício Barbanti Duarte, da UNESP, pesquisador 1B do CNPq. A pesquisa recebeu financiamento de cerca de R$ 800 mil, por edital do Programa de Apoio a Núcleos de Excelência PRONEX/FUNCAP/CNPq.

A reprodução do veado-catingueiro com a utilização da técnica TNCSi, com transferência de material nuclear dessa espécie para células de animais de fazenda, pode ser utilizada como modelo na reprodução de outros tipos de cervídeos. Para clonar o veado-catingueiro, os pesquisadores brasileiros utilizaram óvulos de cabras e de vacas, dos quais retiraram os respectivos núcleos, e fusionaram com o material de células somáticas retiradas da pele de um veado-catingueiro. Após o intervalo de seis a sete dias, os embriões começam a se desenvolver.

Embora a clonagem seja considerada uma ferramenta relevante para a conservação de espécies em risco de extinção, a obtenção de óvulos desses animais em grande número para se executar a técnica constitui um obstáculo. A técnica de TNCSi representa, dessa forma, uma solução, por permitir a utilização de óvulos de animais domésticos para a clonagem de espécies ameaçadas de extinção. A clonagem interespécies já foi utilizada com sucesso para inúmeros animais, como o lobo, o coiote e o camelo Bactrian. Um dos principais interesses na pesquisa desse tipo de técnica envolve a reprogramação das células somáticas, ou seja, células que não podem mais se transformar em outra célula. Pela TNCSi, a célula somática, quando juntada ao óvulo de outro animal, pode se transformar de novo, retornando ao estágio embrionário. Daí se cria um novo indivíduo.

No caso do experimento com o veado-catingueiro, os pesquisadores utilizaram um total de 124 óvulos de cabras e 777 óvulos de vaca para a clonagem. A disparidade nos números se deve à facilidade em se encontrar ovários desses animais nos abatedouros locais. Os resultados do estudo indicaram que os óvulos de cabras e vacas são capazes de reprogramar as células somáticas do veado-catingueiro. Os embriões resultantes do processo chegaram até o estágio de blastocisto, no caso da experiência com os óvulos de vaca. Nessa fase, o embrião se encontra apto para a transferência para a barriga de aluguel. No caso dos óvulos de cabra, os embriões se desenvolveram até o estágio de mórula, que é uma fase anterior à do blastocisto.

Para algumas espécies de veados de regiões neotropicais, já existem bancos criogênicos para estoque de células que podem ser utilizadas em técnicas de reprodução desses animais. O Núcleo de Pesquisa e Conservação de Cervídeos (NUPECCE) da Universidade Estadual Paulista (UNESP) possui um banco de células de mais de um mil animais, pertencentes a 10 categorias de espécies de veados neotropicais. O banco funciona como um repositório da diversidade genética para pequenas populações. Porém, há dificuldades para se produzir embriões derivados dessas células, visto que a população em cativeiro desses veados neotropicais é pequena e não pode ser utilizada para procedimentos invasivos, como laparoscopia.

De acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), das 10 espécies de veado-catingueiro conhecidas, seis são classificadas como vulneráveis e duas são consideradas como de menor preocupação. Não há informações suficientes para se categorizar as outras duas espécies. Veados-catingueiros são fonte de alimento para populações das Américas Central e do Sul e, por isso, passíveis de correr fortes riscos predatórios. No Brasil, se encontram oito espécies de veado-catingueiro, duas delas ameaçadas de extinção. Esse tipo de cervídeo é encontrado em quase todos os biomas do país, com exceção da bacia amazônica, e predomina em toda a região da Mata Atlântica.

A espécie brasileira tem servido como modelo para muitos procedimentos envolvendo cervídeos. O próximo passo dos pesquisadores envolvidos no projeto de TNCSi é o de encontrar uma espécie de animal doméstico que sirva como barriga de aluguel para a transferência de embriões do veado-catingueiro, em uma tentativa de que a gravidez seja levada a termo.

O link para o artigo se encontra abaixo:

https://www.liebertpub.com/doi/10.1089/cell.2019.0069

Coordenação de Comunicação Social do CNPq