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ARTIGO CIENTÍFICO - DA CIÊNCIA PARA VOCÊ
Pesquisadores analisam como o volume de armazenamento dos reservatórios no Semiárido altera a qualidade da água

Autora: Carlinda Railly Medeiros (Pós-Doutora em Recursos Hídricos na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), pesquisadora do Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Regional (CNPq/FACEPE) do Instituto Federal do Sertão Pernambucano).
Co-autores: Joseline Molozzi (Profª na UEPB, coordenadora do Laboratório de Ecologia de Bentos, especialista em Ecologia de Reservatórios e Estuários, Biomonitoramento e Qualidade da Água); e Carlos de Oliveira Galvão (Prof. da UFCG/ Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental . Tem atuação principal em hidrologia do Semiárido, hidrometeorologia e gestão de recursos hídricos)
O semiárido brasileiro é uma região com limitação hídrica, com temperaturas do ar variando de 18 a 31°C e precipitação concentrada geralmente em três meses ao ano. Quando há longos períodos de seca, o nível dos reservatórios (locais que armazenam água da chuva) diminui significativamente. Isso faz com que a água fique com mais nutrientes, o que piora sua qualidade. Com a água mais poluída, alguns animais pequenos que vivem no fundo de ecossistemas aquáticos — chamados macroinvertebrados bentônicos — mudam sua ocorrência e distribuição, em que os organismos mais sensíveis tendem a ser eliminados da comunidade. No entanto, eles são importantes porque ajudam a manter a água limpa e o ambiente equilibrado. Se esses animais mais sensíveis desaparecem, perdemos funções essenciais da natureza, como o fornecimento de água de boa qualidade. Isso afeta diretamente as pessoas que vivem na região e que usam essa água para beber, plantar e para atividades de lazer. Por isso, este estudo investigou como o volume de água dos reservatórios influencia a qualidade da água e a diversidade de macroinvertebrados bentônicos. Esse trabalho atualmente está publicado na Science of The Total Environmental e foi desenvolvido com a parceria de pesquisadores da Universidade Estadual da Paraíba, Universidade de Bristol e da Universidade Federal de Campina Grande que fazem parte do projeto PELD Rio Paraíba Integrado (PELD/RIPA). O projeto PELD/RIPA recebe o apoio financeiro da FAPESQ.
Este estudo foi realizado em oito reservatórios localizados na Paraíba, entre os anos de 2014 e 2022. Em diferentes momentos, foram coletadas amostras de água e de macroinvertebrados bentônicos. Assim, foram analisados:
- Riqueza de taxa que representa o número de diferentes gêneros da comunidade;
- Abundância que representa a quantidade total de indivíduos de cada taxa identificado;
- Índice de Simpson que é um indicador de dominância de espécies na comunidade;
- Índice LCBD que mostra o potencial de conservação dos locais;
- Qualidade da água, estimada pela quantidade de nutrientes como fósforo, nitrogênio inorgânico dissolvido além de clorofila-a.
Com essas informações, foi estabelecido um modelo conceitual que foi testado estatisticamente para entender como as mudanças no volume de armazenamento dos reservatórios influenciam na qualidade da água e a dinâmica da comunidade de macroinvertebrados bentônicos.
Quando os reservatórios do semiárido diminuem o volume, a quantidade de fósforo na água aumenta. Isso favorece o crescimento de espécies exóticas (que não são nativas da região), como o caramujo Melanoides tuberculatus e o molusco bivalve Corbicula largillierti. Esses animais são mais resistentes à poluição e acabam se tornando dominantes, o que pode causar desequilíbrios no ambiente, já que eles competem por espaço e alimento com as espécies nativas. Já o nitrogênio, outro nutriente presente na água, não mostrou relação direta com as mudanças no volume de armazenamento dos reservatórios. Isso pode ter acontecido por esse nutriente na água estar associado a outras fontes de poluição, como o uso de fertilizantes na agricultura ou o escoamento de resíduos de animais criados perto da água. Mesmo quando os reservatórios estão com volumes mais elevados, foi encontrada uma alta quantidade de clorofila-a na água, o que indica a presença de muitas algas (fitoplâncton). Isso pode deixar a água mais turva e com menos oxigênio, prejudicando os animais que vivem no fundo, os macroinvertebrados bentônicos. Com isso, diminui tanto a quantidade quanto a variedade desses organismos, que são importantes para a saúde da água. Esses resultados mostram que mudanças no nível da água afetam a qualidade ambiental e ecológica dos reservatórios. Desse modo, só sobrevivem os animais que conseguem viver em condições mais degradadas, o que facilita a invasão de espécies exóticas e prejudica a biodiversidade e o funcionamento adequado do ecossistema.
Conclusão
Os reservatórios semiáridos são ecossistemas naturalmente suscetíveis à degradação ambiental devido à dinâmica hidrológica da região, que favorece o enriquecimento de nutrientes no sistema hídrico, com impactos significativos na diversidade de macroinvertebrados bentônicos. Esses resultados reforçam a necessidade de medidas adequadas para a gestão dos recursos hídricos estratégicos da região, a fim de garantir a conservação e a manutenção de volumes mínimos de água adequados para promover a saúde e a integridade dos reservatórios e seu uso sustentável.
Acesse o estudo completo em:
https://doi.org/10.1016/j.scitotenv.2024.177881
Minicurrículo de Carlinda Railly Medeiros
Doutora em Ecologia pelo Programa de Pós-Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Pará (UFPA). Mestre em Ecologia e Conservação (2016) e graduada em Ciências Biológicas (2014) pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Após ter concluído a Pós-Graduação atuou como pesquisadora do Instituto Nacional do Semiárido (INSA/MCTI) e realizou dois Pós-Doutorados em Recursos Hídricos na Universidade Federal de Campina Grande. Atualmente é pesquisadora do Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Regional (CNPq/FACEPE) do Instituto Federal do Sertão Pernambucano. Durante sua carreira acadêmica tem desenvolvido pesquisas na área de Ecologia e Ciências Ambientais, explorando padrões de diversidade de macroinvertebrados bentônicos de reservatórios e estuários e suas respostas a fatores hidrológicos, climáticos, antropogênicos e naturais.
Minicurrículo de Joseline Molozzi
Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões Erechim (2003), pós-graduação nível especialização em Ciências Ambientais-Interpretação Ambiental (2004), mestrado em Engenharia Ambiental pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (2006) e doutorado em Ecologia (Conservação e Manejo de Vida Silvestre) pela Universidade Federal de Minas Gerais (2012). Fez Doutorado Sanduíche em Portugal (Universidade de Coimbra) e Espanha (Universidade de Murcia). Foi bolsista de Pós-Doutorado CAPES-UFMG. Atualmente é professora da Universidade Estadual da Paraíba. Tem experiência na área de Ecologia, com ênfase, em Ecologia de Reservatórios e de Estuários, atuando principalmente nos seguintes temas: biomonitoramento, macroinvertebrados bentônicos, qualidade de água, técnicas de geoengenharia, restauração aquática e popularização da ciência.
Minicurrículo de Carlos de Oliveira Galvão
Professor Titular da Universidade Federal de Campina Grande, onde é docente desde 1993, é Engenheiro Civil (1984) e Mestre (1990) em Engenharia Civil/Recursos Hídricos pela Universidade Federal da Paraíba/Campina Grande e Doutor em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1999). Tem atuação principal em hidrologia do semiárido, hidrometeorologia e gestão de recursos hídricos.