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Pesquisa da UFPB mostra a evolução de acordos comerciais do Brasil e uma análise da relação bilateral com a Índia

publicado: 06/10/2025 12h14, última modificação: 06/10/2025 13h42
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AutorElton Douglas Feliciano Lira (Graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

OrientadoraMárcia Cristina Silva Paixão (Doutora em Economia pela Universidade de Brasília. Professora Adjunta do Departamento de Economia da UFPB)

Para Bacha (2013), crescimento baixo combinado com elevada inflação é apenas um dos problemas crônicos pelos quais o Brasil tem sido impactado pelo afastamento comercial de outras economias. E limitação da capacidade de importar tecnologias e inovações é outro problema que leva a atrasos tecnológicos e baixo nível de produtividade. Gonçalvez (2022) alerta que a dependência de poucos mercados para exportação e a falta de acesso a novos podem gerar vulnerabilidade e instabilidade. Nesse caso, a opção de ampliação de acordos comerciais é tida por economistas como uma das principais estratégias para promover uma maior integração mundial do País.

Partindo dessas avaliações, o presente trabalho aprofunda um dos aspectos da análise de Bacha (2013) em seu artigo intitulado “Integrar para crescer: o Brasil na economia mundial”. Especificamente, discutiu dados de acordos comerciais do País, e principais barreiras e desafios enfrentados nesses processos no período 1990-2022. Ainda, benefícios potenciais de acordos entre o Brasil e a Índia foram tratados, explorando-se possibilidades de ampliação do comercio bilateral, dos investimentos estrangeiros no País, da troca de conhecimentos e tecnologias.

Trata-se de uma abordagem descritiva e crítica apoiada em resultados da revisão de literatura, em dados de comércio e acordos comerciais do Brasil, coletados nas bases Comex Stat (MDIC) e Comtrade (UNCTAD), e no site do Siscomex (Governo Federal). Sobre o período estudado, considerou-se o início do processo de abertura comercial do País e a disponibilidade dos dados de interesse.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Um dos princípios fundamentais do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT, na sigla em inglês), a base para o sistema multilateral de comércio da Organização Mundial do Comércio (OMC), é o da não-discriminação. Ele estabelece que os países signatários não estão autorizados a discriminar produtos com base em sua origem. Por exemplo, não podem conceder vantagens, como barreiras comerciais menores, a produtos de um certo parceiro. Contudo, uma exceção a esse preceito é prevista no artigo XXIV do GATT, que viabiliza a celebração de acordos preferenciais desde que impliquem uma promoção substancial de livre comércio recíproco e não elevem barreiras comerciais para terceiros (Krishna, 2004).

Assim sendo, e frequentemente, os países optam por duas formas de integração: a) adotam uma "zona de livre comércio", onde a maioria das mercadorias são comercializadas sem imposição de tarifas aduaneiras e cada país mantém sua autonomia tarifária em relação a terceiros; b) celebram uma "união aduaneira" que, além de prever a não aplicação de tarifas, estabelece tarifas uniformes em relação aos externos (Krugman, Obstfeld e Melitz, 2015). Inclusive, após a finalização das negociações da Rodada Uruguai no âmbito da OMC em 1994, houve uma ampliação das temáticas tratadas nesses acordos: regulamentações relacionadas à saúde e à fitossanidade; proteção de direitos de propriedade intelectual; prestação de serviços transfronteiriços; estabelecimento de diretrizes para investimentos atrelados às atividades comerciais (Oliveira e Badin, 2013).

Nesse cenário, emerge a necessidade de avaliação da posição do Brasil e dos impactos potenciais que a proliferação de Acordos Preferencias de Comércio (APCs) pode ter sobre as operações de comércio exterior do País, na medida em que o priorizou a abordagem multilateral sob a visão governamental de que negociações em fóruns oferecem um ambiente mais favorável para nações em desenvolvimento coordenarem suas estratégias e fortalecerem sua posição em relação a pressões das desenvolvidas. Como ilustra Bacha (2013), o governo fez a opção de priorizar as negociações no âmbito da Rodada Doha da OMC e essa preferência se justificou pela ativa coordenação no G-20 Agrícola, onde o Brasil desempenhou um papel proeminente, juntamente com a Índia. Além disso, adotou uma postura conciliadora nas negociações e fez contribuições substanciais às propostas brasileiras no chamado Pacote Lamy, apresentado em 2008.

Em se tratando da relação Brasil/Mercosul – Índia, Ribeiro (2021), Baumann et al. (2021), Rabelo (2019) e Lins (2017) avaliaram o padrão e oportunidades do comércio e investimentos. Também, examinaram a evolução das relações diplomáticas e a influência de fatores globais nas parcerias estabelecidas. A pesquisa de Lins (2017), em específico, evidenciou o potencial de colaboração em áreas como Ciência e Tecnologia, com foco especial na saúde. Essa ampla gama de abordagens das relações internacionais expressa sua complexidade, aponta para a necessidade de fortalecimento e revela a importância de acordos como instrumentos que podem impulsionar o desenvolvimento econômico.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A estratégia adotada pelo Brasil de colocar os APCs em segundo plano se viu comprometida devido à falta de avanços nas negociações da Rodada Doha. O insucesso dessas tratativas e a notória preferência das grandes economias pelos APCs, distanciou o Brasil de outras economias de relevância global, tanto pela escassez de acordos, quanto pela falta de um modelo que reflita as prioridades e interesses do País. Tal orientação política pode afetar as exportações de forma significativa em um contexto regulatório em evolução, onde acordos desempenham papel preponderante (Bacha, 2013).

A pesquisa revelou que, mesmo em períodos mais recentes, o Brasil apresenta um grau significativamente restritivo em relação ao comércio internacional. Em 2018, registrou um nível de comércio equivalente a, apenas, 25% do seu Produto Interno Bruto (PIB). Como observado por Pereira (2017), no contexto da política de proteção comercial adotada pelo Brasil, destaca-se uma carência de progressos no processo de liberalização após a década de 1990, o que contrasta com o progresso verificado em outras economias em desenvolvimento (Gráfico 1). Ainda, há uma notável presença de barreiras não tarifárias (sanitárias, fitossanitárias, técnicas e controles de quantidade), cujas especificidades frequentemente ultrapassam as médias observadas em escala global. Dessa forma, a combinação de barreiras tarifárias e não tarifárias serve como um obstáculo à expansão da participação do Brasil no comércio internacional (Tinoco; Giambiagi, 2018) (Gráfico).

Outro fato que explica o elevado grau de fechamento da economia brasileira pode ser atribuído, em parte, à já mencionada escassez de negociações de acordos comerciais. Segundo Barboza et al. (2017), houve um aumento significativo no número de acordos de livre comércio envolvendo países em desenvolvimento, passando de 255, em 2010, para 352, em 2016. No entanto, o Brasil permaneceu notoriamente ausente dessa adesão crescente (Tinoco; Giambiagi, 2018).

Observando-se os acordos comerciais em que o Brasil participava em 2022 e suas situações de vigência (Quadro 4), nota-se que o Brasil continua empregando os meios disponibilizados pelo MERCOSUL e pela ALADI para facilitar o acesso aos mercados vizinhos em condições preferenciais. Dentre os acordos listados, uma parte significativa corresponde aos Acordos de Cooperação Econômica (ACEs), mais prevalentes entre os membros da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI). Eles abrangem compromissos que englobam tanto a liberalização do comércio de bens quanto questões do comércio de serviços, propriedade intelectual, investimentos, compras públicas, facilitação do comércio e cooperação.

Para Baumann (2022), a proliferação de tratados e acordos no âmbito da ALADI não tem se revelado adequada para abordar de maneira eficaz dois tópicos de significativa relevância no contexto recente. Um deles é o nível de conteúdo nacional necessário para que um determinado produto usufrua das vantagens resultantes das preferências negociadas nesses acordos. Em comparação com as práticas adotadas em outras regiões, as economias da América Latina impõem um requisito relativamente elevado de valor agregado nacional, o que pode se configurar como um desafio significativo para a consecução de objetivos relacionados à produção integrada em cadeias de valor.

Outra limitação relevante é a insuficiência de esforços, até o momento, para promover o fenômeno comprovadamente benéfico para a competitividade regional: a produção interligada entre diferentes economias. A complementaridade produtiva se destaca como um dos fatores primordiais das exportações, particularmente no setor de produtos industrializados das economias do Sudeste Asiático, América do Norte e Europa Ocidental.

Especificamente sobre a relação com do Brasil com a Índia, os países firmaram um acordo comercial preferencial em 2004. Seu escopo foi concebido como uma parceria entre o Mercosul e a República da Índia porque o Mercosul, enquanto entidade de integração regional, atua como uma união aduaneira, determinando que acordos celebrados por seus membros sejam em nome do bloco.

A implementação efetiva desse acordo ocorreu somente em 2009, revelando um caráter de aplicação tardia, e apresenta uma abrangência bastante limitada: o Mercosul faz concessões tarifárias em uma faixa que varia de 10% a 100%, mas somente para um conjunto de 452 itens da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), que abarca aproximadamente 10 mil itens distintos. Isto é, o acordo se concentrou em setores específicos: químico, farmacêutico, máquinas e equipamentos. E, de forma correspondente, a Índia ofereceu reduções tarifárias na faixa de 10% a 100%, mas igualmente destinadas a um grupo restrito de 450 itens, com ênfase nas categorias de produtos químicos, couro, têxteis, ferro e aço, máquinas e equipamentos.

Por fim, observou-se que os dois países formalizaram um novo Acordo de Cooperação e Facilitação de Investimentos (ACFI) em 2020, com o propósito de ampliar o volume do comércio bilateral para US$ 15 bilhões em um período de três anos. Convém notar que a concepção do acordo se beneficiou da contribuição de relevantes organismos internacionais, bem como da análise dos padrões mais recentes do mercado e, sobretudo, da realização de extensas consultas junto ao setor privado do Brasil. O ex-ministro das Relações Exteriores à época, Ernesto Araújo, ressaltou que, pela primeira vez, se observou uma vontade política muito evidente para expandir o escopo do acordo de preferência tarifária entre o Mercosul e a Índia, abarcando mais de 2 mil produtos.

Ainda, a pesquisa revelou oportunidades específicas relacionadas com setores indianos que têm evidenciado um crescimento significativo no período mais recente: Aviação, Energia, Agricultura, Defesa nacional. Ainda, constatou-se que os setores farmacêutico e da indústria de software experimentaram um notável crescimento nas últimas décadas no contexto das relações comerciais entre o Brasil e a Índia. Assim sendo, sugere-se que pesquisas futuras se aprofundem nesses segmentos a fim de dar continuidade à abordagem iniciada na presente investigação.

Obs.: Texto retirado do TCC de Graduação de Elton Douglas Feliciano Lira, defendido em 2023. Contem adaptações.

Resumo do Currículo de Elton Douglas Feliciano Lira

Graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Gestor de Contas no ramo moveleiro de João Pessoa-PB

Resumo do Currículo de Márcia Cristina Silva Paixão

Doutora em Economia pela Universidade de Brasília (UnB). Professora do Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)