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O trabalho de psicologia associa da tecnologia para a busca de soluções

Pesquisa comprova que tweets revelam valores humanos

publicado: 23/09/2019 08h28, última modificação: 23/09/2019 08h53
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Um dos slogans usados pelo Twitter diz que “o Twitter é o que está acontecendo no mundo e o que as pessoas estão falando à respeito agora”. A plataforma afirma que dita tendências e os psicólogos estão atentos às manifestações humanas no campo digital. E se fosse possível conhecer a fundo os valores humanos dos usuários da rede? Como validar uma análise diante de milhares de dados gerados a cada dia?

Pesquisadores da Psicologia e das Ciências Exatas da Universidade Federal da Paraíba em Rio Tinto (campus IV) se uniram com a finalidade de analisar a viabilidade de usar a inteligência artificial para descobrir os valores humanos das pessoas de acordo com mensagens textuais compartilhadas no Twitter.

O trabalho segue uma característica atual dos projetos acadêmicos que é a associação da tecnologia para a busca de soluções em outras áreas do conhecimento. Nesse projeto, o doutorando em Psicologia Anderson Mesquita do Nascimento, orientado pelo professor Valdiney Veloso Gouveia, queria verificar se as pessoas que dão importância aos valores humanos têm um perfil de palavras, um padrão, por trás da linguagem textual das mensagens de Twitter. “Será que o que elas escrevem revela o que é importante para a vida delas?”, foi a pergunta que balizou a tese de doutorado de Anderson Mesquita.

Especialistas em psicologia afirmam que os textos compartilhados em redes sociais mostram informações sobre a pessoa: estado emocional, opiniões sobre produtos, preferência política e, até mesmo, apontam sinais de distúrbios mentais. “Sabendo disso, a psicologia tem um papel fundamental nos estudos envolvendo pessoas em redes sociais digitais”, escreveu Anderson.

Mas, como executar a tarefa? O orientador Valdiney Gouveia tinha conhecimento das pesquisas realizadas no Centro de Ciências Exatas da UFPB usando inteligência artificial. Bastou esclarecer o desafio para o professor Yuri Malheiros, da Licenciatura em Ciência da Computação da UFPB em Rio Tinto, para a tarefa estar encaminhada.

“A inteligência artificial pode trabalhas com milhares de dados e trazer resultados validados. Existem várias possibilidades de conduzirmos essa pesquisa, mas nós usamos os algoritmos de aprendizagem de máquina”, explicou professor Yuri Malheiros. Dessa forma, foram analisados quase 2,5 milhões de mensagens coletadas.

 

Valores humanos explicam fenômenos sócio-psicológicos

Segundo Anderson Mesquita, os valores humanos possibilitam a compreensão de uma gama de fenômenos sócio-psicológicos, tais como atitudes e comportamentos ambientais, religiosidade, preconceito, consumo de drogas, comportamento antissociais, delinquência juvenil, atitudes frente à tatuagem, intenção de cometer suicídio e até atitudes pró-ambientais. “Os valores podem ser definidos como características abstratas duradouras que servem como princípios que guiam a vida dos indivíduos.”

“O que se exterioriza nas redes sociais pode refletir tanto direta quanto indiretamente. Por exemplo, a pessoa não fala diretamente que a religião é importante para ela; mas faz um comentário sobre a mensagem da pregação”, explica Anderson. “O valor é expresso indiretamente, via comportamento. A maioria das avaliações em psicologia são feitas através do comportamento”, afirma.

“As pessoas normalmente dão importância a aspectos religiosos, respeito às tradições, à família, às hierarquias, à manutenção do status quo da sociedade. E nosso estudo revelou que as mensagens no Twitter revelam exatamente isso”, garantiu o doutorando, que defendeu sua tese em meados de setembro.

 

Pesquisa é baseada em questionário

Anderson Mesquita usou como base para a análise uma Categoria Normativa de Valores a partir de um “conjunto de valores”, cunhado por seu orientador, Valdiney Gouveia. Ela delimita seis categorias de subfunções de valores: Interativa; Normativa; Suprapessoal; Existência; Experimentação; Realização. Essas categorias agrupam valores, por exemplo: a suprapessoal contém o conhecimento, a maturidade. A Existência é a saúde, a sobrevivência; a Realização é o prestígio, poder. E assim por diante.

Com base nessa teoria, a equipe aplicou um questionário divulgado pelo Twitter no qual o internauta respondeu a uma pesquisa de teor psicológico – como os testes de personalidade que circulam pelas redes – e recebeu um feedback quanto à sua personalidade. A pessoa tinha a opção de compartilhar na rede o resultado e convidar amigos a participar. “Com isso, obtivemos a adesão de 2.400 pessoas, aproximadamente. Mas teve um segredo aí! Entramos em contato com um influenciador digital, com uma conta popular no Twitter. Ele fez o teste e indicou para seus contatos. Caiu na rede, deslanchou!”, comemorou Anderson.

“Nós informamos que esses dados seriam coletados para fins de pesquisa, não serão divulgados individualmente de forma nenhuma, e o internauta autorizou a captura das mensagens escritas anteriormente ao questionário. Isso evitou tweets tendenciosos”, disse Anderson.

 

Psicologia e inteligência artificial

Foram testados três classificadores de aprendizagem de máquina, treinados usando mensagens do Twitter, para prever respostas do questionário. Para isso, foram coletados 2.277.832 tweets enviados por 2.496 usuários. Quando as informações capturadas pelos algoritmos foram comparadas ao questionário respondido, o melhor resultado alcançou uma acurácia de 60,08%.

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“O resultado foi surpreendente, porque a variação de mensagens é muito grande. Não usamos nenhum filtro, por assunto, ou coisa do tipo. A pessoa poderia estar falando qualquer coisa. A variação de erro era de 16% e esse número de 60% está muito longe de ser um chute”, ressaltou Yuri Malheiros.

Anderson Mesquita garante que essa é a primeira vez que é comprovado por pesquisa que o ser humano expressa o que é importante para ele no Twitter. Por outro lado, como diz o slogan da plataforma social, o Twitter realmente é “o que as pessoas estão falando à respeito do que está acontecendo no mundo agora”.