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Paraíba e China consolidam parceria
Missão Paraíba-China cumprida? Em parte. A viagem finda, mas o trabalho começa agora. Em meados de julho o governador João Azevêdo liderou uma delegação de governantes e acadêmicos da Paraíba para a China com a finalidade de consolidar parcerias em áreas estratégicas para o desenvolvimento do estado. E ainda, tratativas com empresas e universidades elevaram o radiotelescópio Bingo em construção na Paraíba a dimensões avançadas para rastrear eventos no cosmos: é o Abdus Bingo.
Entre os termos assinados, o secretário da Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior, Claudio Furtado, firmou um Termo de Cooperação com a empresa Dahua Technology, que visa o aprimoramento de pesquisas e do ensino nas áreas da Tecnologia da Informação, gerenciamento de Big Data de Tráfego, Salas de Aula Inteligentes e Bodycam. A expectativa é de montar um laboratório na Paraíba, para que os estudantes usem os equipamentos da empresa como ferramentas de estudo prático e desenvolvimento de novas aplicações de interesse do Estado.
A sinalização para o estreitamento das relações com a China veio do governo federal, quando o Presidente Lula visitou o país em abril deste ano. O Brasil e a China assinaram uma Declaração Conjunta sobre o Aprofundamento da Parceria Estratégica Global. Na área da astrofísica, o documento ressalta o apoio ao projeto Bingo. Nessa cadência, o governo da Paraíba, juntamente com representantes de instituições de pesquisa do estado mobilizaram uma viagem institucional ao país asiático. As esferas executivas e intelectuais da Paraíba estavam representadas num corpo formado por 18 pessoas.
Uma vez em território chinês, a comitiva paraibana se dividiu para atender aos diversos compromissos agendados, de acordo com as propostas encaminhadas antecipadamente por meio do Consulado Geral do Brasil na China, cujo corpo diplomático demonstrou eficiência. Nesse contexto, a ciência básica abriu as portas para excelentes oportunidades bilaterais. O projeto para a construção do radiotelescópio Bingo une cientistas dos dois países desde seu início, em 2016. Além disso, na década de 1990 o professor da UFCG Telmo Araújo (in memoriam) foi o representante brasileiro no Softex China Office, uma iniciativa federal para promover as empresas de software que queriam entrar no mercado asiático, especialmente o mercado chinês.
Com esse retrospecto, torna-se compreensível o sucesso da Missão Paraíba-China realizada em 2023, um marco para o desempenho das instruções que estão na hélice do “DNA” da Paraíba: a ciência e a tecnologia.
Paraíba tem um histórico com a China
Francilene Procópio Garcia, professora no curso de Engenharia Elétrica na UFCG, recorda-se que em 1991 Telmo Araújo dava aulas no mesmo curso e presidia a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec). Ele foi indicado pelo Sebrae Nacional para missão exploratória à Coreia do Sul, ao Japão e à China.
Cinco anos depois, o Softex Brasil estava abrindo ambientes físicos no exterior para atuar na relação com mercados externos. Com a decisão estratégica voltada para a Ásia, a instituição construiu o China Office Softex. Telmo foi convidado para ser gestor do escritório e Francilene o acompanhou não só como esposa, mas como pesquisadora, foi fazer parte do doutorado na Tsinghua University. O casal morou na China por 8 anos e construiu vínculos que permanecem, como narra Francilene procópio:
“A estrutura de pesquisa da China impressionou nos anos 90. Um país ainda fechado, de economia socialista, mas que dentro da governança acadêmica já praticava uma estratégia e um planejamento mais inteligente do que o nosso. Já se encontravam universidades com apoio e incentivos à geração de startups. A universidade Tsinghua, entre as cinco mais importantes da China, tinha uma holding com mil empresas. Vários dos pesquisadores chineses com quem eu convivi entre 1996 a 2000 na área de automação industrial, onde eu desenvolvia o meu doutorado, já tinham patentes que eram internalizadas em empresas criadas com presença de orientandos e ex-orientandos e já fomentavam uma articulação até com projetos internacionais.”
“Eu quero dizer que essa trajetória de 30 anos [desde a ida para a China] tem para mim uma narrativa histórica de muito esforço que é visto no planejamento de longo prazo, coisa que a gente não sabe fazer no Ocidente. Se você discute com os chineses projetos de 2 ou 4 anos, isso para eles é pouco significativo, porque eles olham para planos de 30, 50 anos,com uma continuidade. Tem metas que são reavaliadas a cada cinco anos, então são coisas que os chineses perseguem.”
“Os chineses sempre buscaram autonomia científica. Quando eu passei lá nos anos 90 conheci vários estudantes que tinham colegas chineses fazendo pós-graduação no Reino Unido, na França, nos Estados Unidos e tal. Diferentemente de países como o nosso que não têm uma política pública de fixação de talentos, os chineses incentivam esse tipo de troca. Mas eles querem esses pesquisadores de volta. Então, eles têm uma visão muito clara de onde querem chegar. E o Bingo chega, nessa relação Brasil-China”
Integrando o grupo de acadêmicos nesta viagem à China, Francilene ressaltou: “Particularmente eu vejo o Bingo como um grande guarda-chuva que foi a mola atrativa no primeiro momento, mas as relações que estão no papel, na mesa, são maiores do que o Bingo em termos de parceria. Então acho que isso é uma relação boa e trazer chineses para conviver no ambiente das Universidades pode construir um ambiente plural que Campina Grande, por exemplo, teve lá atrás nos anos 60 quando Lynaldo [Cavalcanti] atraiu cientistas para a cidade, para o início da Universidade Federal da Paraíba.
Internacionalização acadêmica na Paraíba
Nas décadas de 1960, 70, o professor Lynaldo Cavalcanti (in memorian) ocupou cargos institucionais pelos quais promoveu a vinda de pesquisadores de fora do Brasil, especialmente para o campus 2 da Universidade Federal da Paraíba, à época, em Campina Grande, e a ida de estudantes para o exterior. Os frutos de conhecimento em ciência são colhidos até hoje. Com esse histórico, a atual UFCG dá continuidade à internacionalização, a começar por acordos firmados com universidades na China. O movimento também alcança o IFPB, cujos professores integraram a missão Paraíba-China.
A reitora do IFPB Mary Roberta declarou que “na visita à Universidade Jiaot Tong de Xangai (SJTU), foram acertados acordos bilaterais para cooperação científica e educacional. Esses acordos preveem intercâmbio de estudantes de todos os níveis, além de pesquisadores e professores. Adicionalmente, os acordos contemplam intercâmbio de resultados de pesquisas conjuntas, incluindo questões referentes à propriedade intelectual.”
“Na visita à Universidade de Yangzhou (YZU), os instrumentos do acordo incluem, entre outras disposições, previsão para colaboração entre parques tecnológicos, troca de pesquisadores, estudantes e acadêmicos, entre outras ações.
O reitor Antônio Fernandes da UFCG observou o valor dado à educação pelos chineses e o amor às tradições milenares integradas ao cotidiano tecnológico do país onde a maioria dos carros que circulam são elétricos, o papel moeda quase não circula porque as atividades de compra e venda migraram para o smartphone e as telas dominam os espaços nas ruas, nas empresas e nos lares das grandes cidades.
Além das parcerias que promovem intercâmbios entre cientistas e estudantes, a UFCG agora está mais próxima dos Chineses em função do projeto Bingo. “Só com uma das universidades nós fomos contemplados com 200 bolsas para alunos nossos que poderão passar uma temporada lá aprendendo com com com eles e ensinando também. A UFCG, a USP e o INPE são, no Brasil, as principais instituições envolvidas na construção do radiotelescópio. Agora o IFPB também estará trabalhando mais intensamente,” declarou o reitor.
Cidade da Astronomia
Cerca de um milhão de pessoas por ano visitam a Cidade da Astronomia na China, próximo de onde está o radiotelescópio FAST, na província de Guizhou, sudoeste da China. Desde o início das operações desse equipamento, houve uma mudança radical no entorno daquela região, voltada agora para a ciência, educação e turismo.
O secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior, Claudio Furtado, salientou a possibilidade de o Bingo se firmar como o atrativo para o início da construção de uma uma rota de turismo científico semelhante na Paraíba. “A experiência chinesa traz como ideia aqui para o estado para que a gente pense algo semelhante para a região de Aguiar, Souza, Cajazeiras, ou seja, uma infraestrutura no entorno do do radiotelescópio, um planetário, um Mirante que você possa ver o Bingo, visitas ao Vale dos Dinossauros e também um futuro museu de arqueologia em Cajazeiras, onde foram encontradas várias peças nas escavações para a transposição do rio São Francisco”, informou o secretário.
Abdus-Bingo: o maior observatório de radioastronomia do planeta
No grupo de cientistas brasileiros especializados no projeto Bingo estavam o coordenador geral do projeto, Élcio Abdalla (USP), Alexandre Wuensche (INPE), Amílcar Rabelo, Edmar Gurjão, Matheus Pasquali (UFCG) e Alysson Macário (IFPB). Dentre as expectativas para o projeto Bingo, consolidou-se uma ideia que expandirá o alcance do radiotelescópio no universo.
“O Bingo estendido olhará para uma maior área do céu e uma maior profundidade, com mais acurácia. Reunirá uma ação conjunta entre os radiotelescópios Bingo, Fast e Tianlai. Tendo assinado esse acordo nós fazemos parte do maior observatório de radioastronomia do planeta. Temos um projeto praticamente pronto em colaboração com a Holanda, muito avançado em termos de eletrônica, de antenas que poderemos usar como proprietários dessa técnica. Assim, estaremos com os melhores cientistas do mundo buscando soluções para um dos maiores problemas científicos hoje, que é na explicação da ciência fundamental, explicar esses 95% de universo que nós não conhecemos.”
Bingo + Abdus é o nome dado para o conjunto de equipamentos adicionais; é o acrônimo para Advanced Bingo Dark energy Universe Studies. “É uma justa homenagem ao professor Abdus Salam, prêmio Nobel de Física, uma pessoa que eu admirei muito na na minha vida científica, ele já é falecido”, revela Élcio Abdalla.
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