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Nova tecnologia identifica presença de mercúrio no ar

publicado: 19/01/2018 10h41, última modificação: 19/10/2018 09h54

 

Uma pesquisa conduzida pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e pelo Instituto Socioambiental (ISA) constatou que algumas aldeias indígenas chegam a ter 92% de sua população contaminada por mercúrio. Neste caso, boa parte da contaminação se dá pela água, por meio da presença do metal em peixes consumidos pelos indígenas. Contudo, os pesquisadores lembram que o mercúrio presente no ar também é um agravante para a situação.

E foi com foco nesse mercúrio no ar que pesquisadores da Unicamp, em parceria com a Universidade de Victoria (Canadá) e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), desenvolveram um amostrador capaz de medir a quantidade de mercúrio presente no ar e, assim, verificar se uma determinada área está contaminada com o metal. Enriquecido com nanopartículas de ouro em vidro poroso, o dispositivo tem o tamanho de um botão e, em contato com o mercúrio, tem sua coloração modificada.

O professor Ítalo Odone Mazali, do Instituto de Química (IQ) da Unicamp e pesquisador de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), é um dos responsáveis pelos estudos. Ele diz que embora o foco da tecnologia seja a contaminação presente no ar, ela poderia ser utilizada, por exemplo, para avaliar a exposição ao mercúrio de populações que vivem ao redor do Rio Xingu, na região Amazônica. "Eles não estão explorando o ouro, mas estão em uma área próxima da exploração e o mercúrio acaba chegando lá".

Já a pesquisadora estrangeira, também do IQ da Unicamp, Anne Helene Fostier, informa que a população mais exposta ao mercúrio gasoso são os garimpeiros. "Mas esse mercúrio lançado no ar vai ser depositado à curta, média ou longa distância, a milhares de km. Quando o mercúrio é depositado na água, ele acaba sendo incorporado à cadeia alimentar", conta a professora.

A tecnologia pode auxiliar no controle da saúde da população que reside no entorno de regiões onde há mineração de ouro. A ideia é que os trabalhadores do setor de mineração passem a utilizar o dispositivo acoplado a suas roupas. A pesquisa foi divulgada, no último dia 28 de novembro, pelo periódico científico Scientific Reports, publicação do grupo Nature.

Colocado à prova, o sensor já foi testado por trabalhadores de uma mineração e mostrou ser bastante eficiente. Os testes comprovaram que a exposição ao mercúrio gasoso era superior à quantidade estabelecida pela OSHA (Occupational Safety and Health Administration). De acordo com o órgão, o limite máximo de exposição permitida para o vapor de mercúrio é de 0,1 mg/m3 de ar. Em campo, a pesquisa constatou a presença de 30 a 555 nanogramas de mercúrio, número bem superior ao estipulado pela OSHA.

Com participação do professor Elias de Barros Santos, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e ex-bolsista do CNPq, durante seu projeto de pós-dourado pela Universidade de Victoria, os testes foram realizados em uma mina de Burkina Faso, na África, em um ambiente bem contaminado. Durante a extração artesanal de ouro, os mineiros usam mercúrio como amalgamador (utilizado na separação de ligas metálicas). "Depois disso, para separar o ouro da amálgama, é preciso que essa mistura seja aquecida a 400 graus Celsius. Esse aquecimento faz com que o mercúrio evapore e seja inalado pelos trabalhadores", afirma Santos.

Os docentes salientam que a situação precária e insalubre a que os profissionais da mineração são expostos, sem nenhum tipo de preparo para lidar com a exposição ao mercúrio, é um problema mundial. "A estimativa é que existam 20 milhões de pessoas, espalhadas pela América Latina, África e Ásia, trabalhando nessas condições. O ambiente é bem inóspito. Além disso, tem famílias com crianças que vivem nesses garimpos e que estão expostas a esse ambiente", alerta Santos.

Dentre os problemas de saúde ocasionados pela contaminação por mercúrio, estão o nervosismo, ansiedade, irritabilidade, mudanças de humor, agressividade, confusão mental, insônia, lapsos de memória, enxaqueca, alucinações, tendência a cometer suicídio, tontura e labirintite.

Hoje em dia não há tecnologia semelhante no mercado. "Os sistemas que medem o mercúrio na atmosfera, hoje, são muito mais sofisticados, mais caros e que precisam de uma fonte de energia fixa e de gases especiais para funcionar, permitindo uma única medida naquele momento", completa Anne Helene Fostier.

Além de ser um amostrador portátil e que permite obter resultados em poucos minutos, a tecnologia tem como diferencial o fato de ser barata e reutilizável. Os responsáveis pelos estudos estimam o custo para obtenção do dispositivo em menos de 2 dólares. "O sensoriamento é fácil, sendo necessário apenas um celular e um programa que faça convolução em RGB, permitindo acompanhar o nível de exposição total", afirma Mazali.

Coordenação de Comunicação Social do CNPq, com informações do Jornal da Unicamp