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MANIFESTAÇÃO DAS ENTIDADES CIENTÍFICAS SOBRE A PORTARIA 1122/2020 – MCTIC

publicado: 27/03/2020 20h11, última modificação: 27/03/2020 20h11


A Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) reconhecem a importância e o valor de se estabelecer prioridades de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovações, especialmente em cenários de restrição orçamentária. Entendem, no entanto, que este planejamento não pode prescindir do envolvimento da comunidade científica e dos setores tecnológico e empresarial, atores essenciais nestas atividades. Eles podem ajudar na identificação de tais prioridades, de forma articulada com as diversas instâncias do governo, sob a coordenação do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e com a participação de suas agências e unidades de pesquisa. Este tem sido o procedimento adotado nas últimas décadas, quando as políticas de CT&I foram estabelecidas com ampla participação, pelas Conferências Nacionais de Ciência e Tecnologia e consultas públicas, que resultaram em documentos estruturantes como o Livro Branco de CT&I (2002), o Plano de Ação da CT&I 2007-2010, o Livro Azul (2010), a Estratégia Nacional de Ciência e Tecnologia (ENCTI) 2011-2015 e a ENCTI 2016-2022.

Causa-nos, portanto, preocupação que a Portaria do MCTIC Nº 1.122, de 19 de março de 2020, que define as prioridades, no âmbito do MCTIC, para os projetos de pesquisa, de desenvolvimento de tecnologias e inovações, para o período 2020 a 2023, tenha sido elaborada sem uma maior discussão com a comunidade científica. A Portaria certamente identifica áreas importantes e de vanguarda com impactos produtivos, econômicos, sociais e de sustentabilidade, e que seguramente merecem investimentos e apoio, mas omite a necessidade de apoio à ciência básica, fonte fundamental do conhecimento e da formação de recursos humanos qualificados, sem os quais não há desenvolvimento tecnológico e inovação.

No Projeto de Ciência para o Brasil (ABC, 2018), que contou com a contribuição de dezenas de destacados cientistas brasileiros, destaca-se que “...O objetivo da ciência básica é, simplesmente, expandir o conhecimento humano. Mas sua importância não se limita a isso. O conhecimento adquirido pode inspirar soluções para problemas, ou inovações que podem gerar benefício para a sociedade ou para o meio ambiente, por exemplo. Na maior parte dos casos, a ciência aplicada se vale das descobertas e teorias científicas enunciadas e construídas pela pesquisa básica, acumuladas ao longo de séculos. Assim, é possível dizer que a pesquisa básica alimenta e nutre a pesquisa aplicada, sendo, portanto, fundamental para o desenvolvimento tecnológico – mais um motivo pelo qual merece atenção e apoio por parte do Estado, dos governos e de todos os gestores que almejam o crescimento econômico e social de suas nações. Não por acaso, as sociedades que mais apoiam a pesquisa básica são aquelas onde também florescem, com mais vigor, as ciências aplicadas, a inovação e, por conseguinte, o bem-estar social e a qualidade de vida.”

A ABC, a SBPC e as Sociedades Científicas listadas abaixo reforçam que os investimentos em CT&I nos próximos anos não podem negligenciar o apoio à ciência básica, em paralelo às ações de indução nas áreas tecnológicas e de inovação consideradas prioritárias. Programas amplos como o programa dos INCTs, o Edital Universal, o PIBIC e os demais programas de bolsas do MCTIC são estratégicos para a produção de novos conhecimentos científicos, para a consolidação de jovens pesquisadores e para a formação de profissionais inovadores. Também no âmbito dos Institutos do MCTIC, o alinhamento com as prioridades constantes da Portaria do MCTIC, que se aplica a muitos desses Institutos, não deve impedir o desenvolvimento da pesquisa básica naqueles que têm essa vocação e se destacam no cenário internacional. Neste sentido, solicitamos que as prioridades, como colocadas na Portaria, sejam rediscutidas com a comunidade científica, especialmente em relação ao apoio à ciência básica, aí incluídas evidentemente as ciências humanas e sociais, na medida em que não se pode ignorar que o domínio da cadeia de conhecimentos é imprescindível para o desenvolvimento econômico e social do país e para a soberania nacional.

Ao encerrar, como sempre o fazemos, nos colocamos ao seu dispor para o necessário diálogo com vistas aos desafios e às políticas públicas adequadas e eficazes para o desenvolvimento da CT&I no Brasil.

Atenciosamente,

LUIZ DAVIDOVICH - Presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC)
ILDEU DE CASTRO MOREIRA - Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência