Notícias
ARTIGO CIENTÍFICO - DA CIÊNCIA PARA VOCÊ
Estudo apresenta importantes avanços ao investigar o papel das células T reguladoras (Tregs) na resposta imune à infecção pelo SARS-CoV-2

Título do artigo: Células Treg na COVID-19
Differential regulatory T cell signature after recovery from mild COVID-19
Publicado na revista: Frontiers Immunology, Ano: 2023
Autor: Pedro Henrique de Sousa Palmeira (mestre em Ciências Fisiológicas (PPGMCF/UFPB) e doutorando na pós-graduação de Bioquímica e Imunologia da UFMG)
Orientadora: Tatjana Souza Lima Keesen (profª do Departamento de Biologia Celular e Molecular do Centro de Biotecnologia/UFPB)
A pandemia de COVID-19, causada pelo SARS-CoV-2, representou um dos maiores desafios sanitários globais das últimas décadas, evidenciando a necessidade urgente de compreender os mecanismos imunológicos que determinam a progressão e a gravidade da doença. Nesse contexto, nosso estudo apresenta importantes avanços ao investigar o papel das células T reguladoras (Tregs) na resposta imune à infecção pelo SARS-CoV-2, um aspecto até então pouco explorado. Por meio da comparação entre indivíduos saudáveis e aqueles recuperados de quadros leves ou graves de COVID-19, identificamos alterações significativas no perfil funcional das Tregs, especialmente em pacientes que evoluíram com formas leves da doença. Notadamente, este grupo apresentou maior frequência de Tregs, bem como aumento na expressão de moléculas imunorreguladoras, como IL-10, IL-17, perforina, granzima B, PD-1 e a coexpressão de CD39/CD73, após estimulação com peptídeos sintéticos do SARS-CoV-2. Esses achados são de extrema relevância, pois sugerem que uma resposta regulatória robusta pode ter contribuído para conter a inflamação e prevenir a progressão para formas mais graves da doença. Além disso, observamos que, em indivíduos recuperados de casos leves, a presença de sintomas específicos como dispneia ou dor musculoesquelética esteve associada a perfis distintos de expressão de marcadores como perforina, granzima B, CD39 e CD73 nas Tregs, evidenciando uma possível modulação funcional dessas células conforme o quadro clínico apresentado. De maneira impactante, nossos resultados indicam que alterações no repertório imunossupressor das Tregs podem influenciar diretamente o desfecho clínico da COVID-19, funcionando como um possível fator protetor contra a evolução para quadros severos. A identificação dessa modulação entre indivíduos que desenvolveram ou não determinados sintomas reforça a importância das Tregs como potenciais alvos terapêuticos para intervenções imunomoduladoras no contexto da COVID-19 e de futuras pandemias. Em suma, este estudo amplia significativamente o conhecimento sobre a imunopatologia da COVID-19, apontando as Tregs como elementos-chave na determinação do perfil clínico da doença e abrindo novas perspectivas para estratégias de diagnóstico, prognóstico e tratamento imunológico.
Em dezembro de 2019, foi observada uma pneumonia de etiologia desconhecida em Wuhan, China, que posteriormente foi associada a um novo betacoronavírus (1). Nomeado Coronavírus da Síndrome Respiratória Aguda Grave 2 (SARS-CoV-2), esse novo patógeno é o agente causador da Doença do Coronavírus 2019 (COVID-19) e foi responsável pela pandemia anunciada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 11 de março de 2020. Embora a doença possa se manifestar com um amplo espectro de apresentações, incluindo casos assintomáticos e sintomas graves que podem resultar em morte, a maioria dos indivíduos afetados desenvolve uma condição não grave.
A emergência de saúde pública causada pela infecção pelo SARS-CoV-2 motivou a comunidade científica a avaliar a resposta imune, revelando a contribuição significativa do sistema imunológico na progressão da doença. Nesse contexto, fatores como a carga viral e a eficácia da imunidade, especialmente aquela mediada por moléculas denominadas citocinas parecem ser fundamentais para a resposta adaptativa e os desfechos clínicos. Por exemplo, o tempo de atuação de células conhecidas como linfócitos T CD4+ foi associado a diferentes condições clínicas. Além disso, diminuição de linfócitos e baixo imunidade foram associados ao aumento da gravidade nos casos de COVID-19.
As células T reguladoras (Tregs), uma subpopulação de linfócitos T CD4+ com funções reguladoras, desempenham um papel crucial na autotolerância e no equilíbrio imunológico em algumas doenças. No contexto da COVID-19, alterações nas subpopulações de Tregs produtoras de citocinas e marcadores de inflamação como a IL-10 e o CD39, ou um desequilíbrio entre Tregs e outra subpopulação de células T CD4, denominadas Th17, podem estar associadas à gravidade da doença. No entanto, resultados divergentes em relação à frequência desses linfócitos levantam questões sobre o papel das Tregs na progressão da doença.
Assim, para compreender melhor o papel das Tregs no contexto da infecção por SARS-CoV-2, nosso grupo avaliou células CD4 reguladoras (Tregs) com base em sua frequência e na expressão de citocinas, capacidade de matar outras células, receptores inibitórios e enzimas que convertem moléculas inflamatórias (ectonucleotidases) no sangue periférico de voluntários recuperados de formas leves e graves da COVID-19. Entre os voluntários que se recuperaram da forma leve da doença, comparamos os parâmetros imunológicos entre aqueles que apresentaram e os que não apresentaram determinados sintomas. Observamos um perfil imunológico diferencial das Tregs após a resolução da doença, particularmente no grupo de voluntários que se recuperaram da infecção leve por SARS-CoV-2. Este estudo aponta para uma mudança fundamental no perfil das Tregs, que pode ajudar a comunidade científica a entender o papel dessa subpopulação de linfócitos no curso das diferentes formas clínicas da COVID-19.
Conclusões e resultados:
No presente estudo, observamos frequências mais elevadas de Tregs no sangue de pacientes recuperados que apresentaram a forma leve da COVID--19Parte inferior do formulário e maior expressão de citocinas IL-10, e IL-17, marcadores citotóxicos, como a perforina e granzima B, e marcadores de reversão de quadro inflamatório como o CD39 e o CD73, em comparação com o grupo controle saudável (HC) ou o grupo recuperado da forma grave. Também observamos uma frequência diferencial de Tregs expressando marcadores imunológicos entre as células de voluntários recuperados da forma leve que apresentaram ou não determinados sintomas durante a fase aguda da COVID-19. Dessa forma os resultados desse estudo também mostraram que a dispneia foi associada a altos níveis de produção de moléculas citotóxicas pelas células estudadas, sugerindo quadros de maior controle da doença em pacientes que não desenvolveram gravidade.
Por fim, nosso estudo revela dados importantes sobre a participação das Tregs na COVID-19, sugerindo que a modulação de marcadores imunossupressores pode, em parte, conduzir a uma forma leve da doença, e que essas alterações possivelmente ocorridas durante a fase aguda podem persistir por meses. É importante destacar que este estudo incluiu apenas voluntários não vacinados. Assim, acreditamos que este estudo contribuiu significativamente para que a comunidade científica avance e adquira mais conhecimento sobre a contribuição das alterações imunológicas ao nível de células, como a exemplo das Tregs para o desenvolvimento de perfis clínicos distintos na COVID-19, ampliando significativamente o conhecimento sobre a imunopatologia da COVID-19 e abrindo novas perspectivas para estratégias de diagnóstico, prognóstico e tratamento imunológico.
Resumo do Currículo de Pedro Henrique Sousa Palmeira
Graduado em Biotecnologia e mestre em Ciências Fisiológicas pelo Programa de Pós-Graduação Multicêntrico em Ciências Fisiológicas (PPGMCF) Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Fez parte do grupo coordenado pela professora Dr. Tatjana Keesen no Laboratório de Imunologia das Doenças Infecciosas (LABIDIC) da UFPB, no qual atuou em dois projetos de iniciação científica (2017 - 2019). Contemplado com o prêmio Jovem Pesquisador no XXVII Encontro de Iniciação Científica (2019), bem com o Prêmio de Iniciação à Docência no XXI Encontro de Iniciação à Docência (2019). Durante a graduação e mestrado desempenhou estudos com linfócitos T CD4+ e células T reguladoras frente a infecções virais, a fim de contribuir com a busca de biomarcadores de prognóstico e tratamento. Atualmente é doutorando na pós-graduação de Bioquímica e Imunologia da Universidade Federal de Minas Gerais, orientado pelo professor Dr. Mauro Martins Teixeira.
Resumo do currículo de Tatjana SL Keesen
Professora Dra. Tatjana Keesen é graduada em Odontologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (2001). Realizou mestrado (2007) e doutorado (2010) em Bioquímica e Imunologia pela Universidade Federal de Minas Gerais. Durante o período de junho de 2010 a maio de 2011 foi bolsista de pós-doutorado júnior (PDJ) pelo INCT-Doenças Tropicais. Foi professora visitante do departamento de Bioquímica da UFRN no período de setembro de 2011 a fevereiro de 2013. Atualmente é bolsista de produtividade do CNPq nível 2. Além disso, atua como professora associada do departamento de Biologia Celular e Molecular do Centro de Biotecnologia da Universidade Federal da Paraíba. É membro permanente dos programas de Pós-Graduação em Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos, Biotecnologia (Mestrado), e do Programa Multicêntrico de Pós-Graduação em Ciências Fisiológicas (CBiotec/UFPB). Especialista em caracterização celular e molecular de marcadores imunológicos relacionados à fisiopatologia de doenças infecciosas e metabólicas humana, atuando principalmente nos seguintes temas: imunologia celular e molecular, imunogenética, doenças infecciosas, obesidade e citometria de fluxo.