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Comunidade e cientistas trabalham na restauração dos corais no Seixas

publicado: 28/03/2022 13h31, última modificação: 29/03/2022 13h34
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Implantação de coral - Karina Massei - com um fragmento de coral tapitanga em branqueamento (Foto Carlinhos.acs)

Notícias sobre desmatamento em florestas são mais comuns de serem encontradas e geralmente abordam as ameaças desse fato ao aumento do aquecimento global. Por outro lado, pouco é dito na imprensa sobre o papel do oceano para o equilíbrio dos gases atmosféricos. O oceano retira o CO2 do ar e o mantém nas profundezas; atua como um regulador do sistema climático e promove um ambiente apropriado para a vida em quase toda a superfície da Terra. Só isso já justificaria o apoio a projetos de restauração e conservação dos ambientes marinhos. Mas os argumentos se acentuam quando se acrescentam valores sociais e econômicos.

Essa é a dimensão da pesquisa “Restauração ecológica de corais”, realizada pela bióloga marinha Karina Massei, em nível de pós-doutorado, pela Universidade Federal da Paraíba. Conta com parceiros da iniciativa privada, de organizações não governamentais, de moradores locais e com apoio do governo do Estado da Paraíba por meio do Programa de Bolsas de Pesquisa de Pós-Graduação, através da Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba.

O campo experimental é as piscinas naturais do Seixas, em João Pessoa; abre oportunidades para ampliação do turismo sustentável e pedagógico; promove a economia, desenvolve a pesquisa em biotecnologia; envolve moradores locais que trabalham com a pesca e com o turismo, a comunidade científica, gestores públicos, órgãos como a Capitania dos Portos da Paraíba, a Polícia Militar, a PBTur, estudantes,entre outros. Um esforço conjunto canalizado para a conservação marinha.

O Greenpeace informa que mais de 90% do excesso de calor produzido pelos gases de efeito estufa tem sido absorvido pelo oceano. “E tem mais. Sob certas condições, o CO2 se dissolve naturalmente na água e é puxado para as profundezas pelas correntes oceânicas, mantendo-o fora da atmosfera a longo prazo”. Se esse carbono fosse lançado na atmosfera, o planeta estaria muito mais quente.

Ao longo dos anos o oceano vem absorvendo volumes cada vez maiores de dióxido de carbono (CO2) e, por isso, a água tem se tornado mais ácida, influenciando na saúde de animais e vegetais marinhos. Isso é observado nas piscinas do Seixas, tanto pelos pesquisadores quanto pelas pessoas que frequentam o local há anos, como Daniel Virgílio Basílio Crispim da Silva, guia turístico náutico, pescador que atua no Seixas desde 1998.

“Eu nunca tinha visto tantos corais branqueando ao mesmo tempo e num espaço tão curto de tempo. Havia, mas era uma pontinha aqui, outra ali. De 2020 para cá, foi repentino. Tem uma espécie específica de coral que está morrendo em massa. É o que chamamos de tapitanga (“Millepora alcicornis”). E eles atraem os peixes, lagostas, polvos. Agora não encontramos mais algumas espécies de peixes que estavam aqui em 2019”, diz Daniel, alarmado.

O guia turístico Daniel e colegas que trabalham no Seixas estão engajados no projeto de pesquisa para a restauração ecológica de corais porque têm esperança de que essas espécies retornem ao habitat. “Além disso, o turista só retorna ou indica o passeio quando ele comprova que os prestadores de serviço estão engajados na conservação do ambiente”.

Segundo Daniel, 12 catamarãs com capacidade média de 100 pessoas se distribuem pelas piscinas do Seixas em dias de maré baixa. Esse é um dos fatores que contribui para a degradação, conforme aponta Karina Massei;mas há outros: “Há um consenso entre os pesquisadores de que o branqueamento dos corais ocorre porque o coral sofre com o aumento da temperatura da água e desprende uma microalga que lhe fornece nutrientes e a cor. Também, pelo o oceano estar mais sobrecarregado de gás carbono, ele está mais ácido, o que atinge os corais e outros animais. Por isso estamos vendo o branqueamento em massa desde 2020, a demora para esses corais se recuperarem e, infelizmente, a morte de muitos deles”.

É neste apelo que a pesquisa científica se insere. Na última segunda, foram implantados no recife, simbolicamente, protótipos de bioatrator de corais -  fragmentos de recifes manipulados biologicamente que servirão de base para a colonização de corais. Um marco inicial para um trabalho cuja intenção vai além de conservar a vida nos recifes do Seixas. É mostrar que estamos, todos e todas, em uma via de mão dupla: “enfrentar as mudanças climáticas é fundamental para o oceano; e protegê-lo também é fundamental para regular o clima no planeta”.

Um dos produtos que a pesquisa científica realizada por Karina Massei, executada no âmbito do Programa de Ecologia e Monitoramento Ambiental (PPGEMA/UFPB Rio Tinto) e supervisionada pela professora Dra. Cristiane Sassi, é o Bioatrator Recifal Multifuncional.

São suportes feitos com o rejeito do marisco processado com cimento de sílica (ecológico). O material é compactado dentro de uma estrutura estilizada e produzida por impressora 3D.

Nesta estrutura estilizada serão encaixadas peças menores, onde estarão os fragmentos de corais transplantados. A área em que será instalada a unidade amostral do projeto, nas piscinas naturais do Seixas, foi tema da tese de doutorado da bióloga. Já foram realizados, portanto, estudos prévios necessários (geomorfologia, levantamento da fauna e flora, caracterização socioambiental da área).

Os bioatratores serão monitorados quinzenalmente, sendo os dados inseridos na plataforma aberta www.sisfaumar.com, já em operação.

Em formas artísticas, os bioatratores têm como principal matéria prima as conchas de mariscos, são descartadas constantemente depois da retirada do marisco para alimento. Terão um destino mais nobre ao compor a base natural que vai sustentar o fragmento coral. As estátuas submersas, onde os corais crescerão, serão uma atração turística diferenciada e oportunidade para educação ambiental. Irão melhorar os habitats marinhos e expandir as populações pesqueiras, proporcionando oportunidades criativas, econômicas e de captura de carbono da atmosfera.

Globalmente, existem projetos similares, utilizando diversas biotecnologias. O desafio no Brasil, é adaptar para as nossas espécies, que são endêmicas. Neste sentido, existe um projeto em Porto de Galinhas que tem sido base para a pesquisa na Paraíba.

O dia em que os primeiros fragmentos de recifes manipulados biologicamente seriam colocados no mar do Seixas amanheceu chuvoso. A implantação da pesquisa integrava as atividades da Semana do Consumidor Consciente promovidas pelo Procon-PB, em alusão ao "Dia da Água”.

 As pessoas seriam recebidas no Espaço Oceano, um local em frente ao mar que agrega atividades náuticas e de pesquisa científica. Estavam convidados representantes da Superintendência do Meio Ambiente da Paraíba (Sudema), da Defensoria Pública da Paraíba, da PBTur, de ONGs, o Capitão de Fragata Erijansen de Souza Maciel, da Capitania dos Portos da Paraíba, o presidente da Fapesq-PB, Roberto Germano, o secretário-executivo da Ciência e Tecnologia da Paraíba, Rubens Freire, Késsia Liliana Dantas Bezerra Cavalcanti, superintendente do Procon-PB, o Coronel Tibério, do Estado Maior da Polícia Militar da Paraíba, a coordenadora do curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Maurício de Nassau, Patrícia Oliveira, apoiadores da iniciativa privada e amigos.

A chuva que poderia atrapalhar caiu timidamente e recuou. No mar, o presidente da Fapesq, Roberto Germano, foi um dos convidado para implantar um dos fragmentos: “Só quando estamos aqui entendemos o impacto global que tem uma ação como esta. A Paraíba, com o litoral que tem, requer pesquisas científicas nesse nível”, afirmou Germano.  Além de Roberto Germano, Christina Vasconcelos, coordenadora de Estudos Ambientais da Sudema, Alexsandro Batista, líder do Grupo CaiaquePB, e Daniel Crispim da Silva implantaram fragmentos de corais no recife.

Márcia Dementshuk